06 agosto 2007

Sudoeste Dia 3 - Entre A Palavra e a Androginia

Ao terceiro e penúltimo dia do festival Sudoeste, a palavra foi o que marcou a ordem do dia com as prestações de The Streets e dos portugueses Sérgio Godinho e Sam the Kid. Já do outro lado (Palco Planeta Sudoeste) a androginia de Patrick Wolf levou muitos a histeria, mas quem levou o troféu pelo melhor momento da noite foi sem dúvida o projecto de Mike Skinner. O colectivo Groove Armada cumpriu com as expectativas, depois de uma mudança súbita de horários e de alguma chuva que não fez arredar pé os mais resistentes.


Sérgio Godinho é um representante de uma geração mais antiga, que viveu o 25 de Abril na pele, tendo (quase) sempre a revolução como porta-estandarte das suas canções. No entanto, tal facto não impediu que o cantor se adaptasse ao ambiente festivaleiro, conseguindo animar o público que se encontrava no festival. A abrir com o single de apresentação do seu mais recente disco, «Ligação Directa», mostrou como a sua composição ainda está em muito boa forma, mas foram temas históricos como «O Primeiro Dia» e «Com Um Brilhozinho nos Olhos» que as hostes mostraram mais entusiasmo.

Representante já da nova geração é Sam the Kid, que se seguiu a Sérgio Godinho, e que provou para quem tinha alguma dúvida que este é o maior artista de hip hop nacional, estando ao nível (ou até ultrapassando) vários conceituados internacionais. Acompanhado pelo baixista dos Cool Hipnoise e João Gomes do mesmo coelctivo, mais a sua trupe, Sam the Kid apresentou a sua grande obra «Pratica(mente)», que ao vivo ainda cresce mais com a adesão do público às rimas revolucionárias deste poeta urbano.

Pouco depois de Samuel Mira entrar em palco, Patrick Wolf iniciava o seu espectáculo no palco secundário. Se quando começou a carreira o violino era a peça central da música de Patrick Wolf, agora ao fim de três discos de originais e muito concerto na estrada, esse instrumento já é remetido maior parte do tempo para uma acompanhante de espectáculo, uma vez que este inglês agora está mais preocupado em dar um bom espectáculo de entretenimento, onde o preconceito não entra e as barreiras são facilmente quebradas. Patrick Wolf é um performer, que arrasa com o público, seja pelo seu strip-tease (que por muito pouco não foi integral), seja pela intensidade com que se entrega às canções e aos fãs, o que foi uma preocupação para os seguranças quando o músico se misturou com o público para cantar «Get Lost». No Sudoeste o cantor encontrou um público bastante conhecedor do seu trabalho, e pelas reacções após o concerto, conseguiu amealhar muitos mais fãs. Patrick Wolf está prestes a tornar-se uma coqueluche em Portugal.

Onde a palavra tem um lugar de destaque é também nos temas do projecto The Streets, que por estes lados se esperava com mais ansiedade. As expectativas eram elevadas, mas o medo de falhar também era muito, já que as músicas de Mike Skinner estão muito concentradas na produção de estúdio, o que poderia falhar em concerto. A verdade é que não falhou, mas superou e arrasou. Envergando uma t-shirt oficial do festival e descalço, Mike Skinner subiu ao palco com mais um rapper, um baterista, dois teclistas e uma cantora nos coros e revelou um espírito bastante descontraído, sempre pronto a ter um contacto mais próximo com o público, ora falando várias vezes em português, ora dando-lhe dicas para que a animação se elevasse ao máximo. O single «When You Wasn’t Famous» levou todos ao rubro, tal como «Weak Become Heroes» ou a fechar «Fit But Yu Know It», com incitações ao mosh pela parte de Skinner. Por entre as suas canções que relatam os ambientes urbanos sem falinhas mansas, foram tocados muito rapidamente temas de outros grupos, como «Over & Over» dos Hot Chip, «Out of Space» dos Prodigy ou «I Love Rock’N’Roll» dos The Arrows. Com algumas das melhores canções que ouvimos nesta década, uma presença em palco perfeita para concertos e uma entrega de louvar, Mike Skinner com o seu projecto deu o grande concerto do festival.

Depois veio a chuva, enquanto os The Australian Pink Floyd prestavam tributo obviamente aos Pink Floyd. Mas os festivaleiros não se deixaram abater e não arredaram pé para ver a actuação dos Groove Armada (que só tocaram às 3h30 devido a problemas com o avião). Da dupla só veio Andy Cato, mas que se fez acompanhar de vários músicos e vocalistas e de um espectáculo visual muito forte, que fizeram do recinto a maior pista de dança ao ar livre em Portugal. Mas nem sempre esta pista de dança esteve ao rubro, pois se a festa foi grande ao som de êxitos como «I See You Baby» e «Superstylin`», pelo meio houve um outro momento mais calmo, que por pouco entrava na monotonia, devido a uma aproximação aos toadas lounge. Mas quando a receita era de house com soul e hip hop, esquecíamo-nos dos momentos mais fracos.

Com o sol a desaparecer, espera-se um final em grande para o último dia do festival Sudoeste que recebeu uma das maiores enchentes de sempre. Esperemos pelo regresso dos James e pelas estreias há muito aguardadas de Of Montreal e The National.

in Disco Digital, por João Moço