12 julho 2008

Alive!08 - Dia 2 : De Dylan ao Kuduro

É uma das principais figuras da história da música americana do século XXI, e teima prolongar a lenda editando discos de qualidade superior («Modern Times» de 2006 foi considerado disco do ano para muito boa gente), e actuando ao vivo pelos palcos do mundo. As revistas de imprensa musical internacionais dedicam-lhe mensalmente largos espaços de documentação, a sua vida é retratada no cinema, há biografias muito interessantes à venda. Bob Dylan é por estes dias uma lenda viva, e muito estimada, do rock americano, e actuou esta sexta feira à noite em Lisboa no dia mais esquizofrénico do Festival Alive!


Ter Bob Dylan no meio de John Butler Trio, e Within Temptation é, no mínimo, estranho. Dylan provavelmente nem sabe quem subiu ao palco depois da sua banda. Nem tem de saber. Bob Dylan interioriza o seu papel de lenda viva e continua a apresentar-se como uma força maior da natureza deixando poucos traços humanos à mostra. Não autoriza qualquer tipo de captação profissional de fotografias, recusou a transmissão televisiva, e não foi nada fácil a organização do Festival convencê-lo a deixar passar as imagens do concerto nos ecrãs gigantes do recinto. Só três câmeras estáticas e nada de ampliações de imagens. A disposição do músicos em palco é curiosa. Bob Dylan não está em espaço de destaque, prefere ficar de pé em frente aos seu teclado virado para os seu excelentes músicos, de lado para a audiência. Entre as músicas não há diálogos. Ali só canções, e estilo de quem vai a caminho dos 70 anos e mostra uma figura impecável com o seu típico chapéu.

Bob Dylan sabe que tem a plateia do seu lado. Média de idades bem mais alta do que se viu ontem, e a esmagadora maioria está lá para o contemplar. Daí que as canções sucedem-se e a reacção da multidão é sempre a mesma: gingar os corpos ao sabor daquela mistura de blues, folk, rock tão emotivamente genuína como «Highway 61 Revisited» ou «Thunder On The Mountain». É emocionante ver como ainda hoje Dylan coloca a voz por cima de excelentes instrumentalizações da sua banda dando-nos a oportunidade de presenciarmos um pouco da história do rock ao vivo e a cores. Dylan é um ser maior em que até as birras, e pose arrogante lhe acentam bem. Um concerto que fica na história do Alive como também na memória colectiva. Excelente!

O dia voltou a não começar bem para a organização com o cancelamento do concerto dos Nouvelle Vague que ficaram em Paris sem vôo para cá. Ganharam os Kumpania Algazarra que puderam mostrar o seu alegre disco de estreia recente. Ainda mais aproveitou o australiano John Butler e o seu Trio que conquistaram o povo com uma folk pincelada de reggae, e fizeram muitos amigos com a actuação estendida para mais de hora e meia aproveitando o «furo» deixado pelos Nouvelle Vague.

Depois do superior Dylan vieram os Within Temptation. A desertificação do espaço frontal ao palco no fim de Dylan mostram bem o desprezo pela banda seguinte. É natural, tinhamos acabado de ver Bob Dylan não devia ter subido mais ninguém aquele palco... O público na sua maioria abandonou o recinto. Isto também porque depois da louca, e histórica, noite de arranque com um desfile de excelentes bandas novas hoje o palco principal só recebeu a visita de DJs de menor expressão, e por isso mesmo não servia de alternativa ao principal.

Depois das melodias, ambientes, e da voz da aniversariante Sharon den Adel meia gótica dos holandeses Within Temptation terem deliciado os poucos, mas efusivos, fãs, e ter desesperado a restante maioria de resistentes, veio a recompensa com um final épico ao som dos Buraka Som Sistema.

Mais uma confirmação que os Buraka são neste momento uma das raras bandas que Portugal tem para apresentar ao mundo sem receios. A base do kuduro a servir de suporte às fortes batidas dançáveis, está mais consistente que nunca. Muitos concertos, o lançamento do disco de estreia «Black Diamond» para breve também ajuda à coesão do grupo. Esta noite além da habitual energia que transborda do palco para a saltitona plateia houve também surpresas. Destaque para a aparição de Pacman dos Da Weasel para cantar uma versão de «Dialetos de Ternura». Um fim em grande para a segunda noite do Alive que será lembrada pela actuação de Dylan.