O espaço que se segue é da responsabilidade do membro do Fórum Sons, AliveRockBoy.
O rapaz foi atrás de um sonho e voou até Birmingham para assistir a um dos raros concertos de Dave Matthews na Europa.
Eu adorava ver a Dave Matthews Band ao vivo, é um desejo que já vem de longe. Quando vi anunciadas datas para Dave Matthews em Inglaterra pensei que era desta que eu os ia ver, mas os preços elevadíssimos dos bilhetes, e o facto de ser o líder a solo sem a banda por trás, desencorajou-me.
Pedi ao AliveRockBoy que escrevesse uma prosa sobre a sua aventura para poder partilhar com os leitores do Grandes Sons. Pode ser que qualquer dia seja eu a assinar a reportagem de um concerto da DMB, ainda não perdi a esperança. Muito obrigado AliveRockBoy.
O sonho interrompido
São mais ou menos 11h40 quando o avião da Ryanair toca o chão do Aeroporto de Stansted. Londres recebe-nos fria e com um céu cinzento como é seu apanágio. Mas para nós, o dia não podia ser mais azul e o ambiente não podia estar mais quente. Depois de ultrapassarmos a má organização da alfândega do aeroporto (não é só cá em Portugal) e depois de termos descoberto que para alugarmos o carro que tínhamos reservado afinal ainda tínhamos de pagar mais umas boas libras por mais uns seguros, partimos em direcção ao destino desejado.
O dia tinha contornos de sonho. Era tudo tão estranho… os carros a andarem do lado contrário, a paisagem vasta e totalmente amarela… nada ali nos era familiar.
Por volta das 16h00 entramos em Birmingham. Passamos à frente da Academia. O ambiente ainda estava pouco mais do que nulo. Estranhamos. Sabíamos que as portas abririam às 18h00 e estamos habituados a ver em Portugal longas filas de espera umas boas horas antes da parede de ferro se abrir para nos dar passagem. Ali não estariam mais de 20 pessoas. Aproveitamos a pouca afluência para irmos almoçar. No regresso o ambiente já se começava a compor. Eram agora 17h00. Faltava pois apenas uma hora para o primeiro momento do dia. Agora a fila já se estendia por umas centenas de metros e ficámos algo tristes por nos imaginarmos bem longe do palco. Quando já se definiam estratégias para furar até lá à frente acontece algo totalmente inesperado. Na parede que acompanhava a fila começam a ser coladas folhas de papel que anunciavam a existência de uma “Fast Track”. Em resumo, era uma nova fila que se formaria e que teria prioridade sobre a fila normal para o concerto. E para entrar nessa fila bastava ir ao Bar da Birmingham Academy beber qualquer coisa. Ao início não acreditámos. Pensávamos ser alguma brincadeira de amigos. Depois, quando um dos seguranças do recinto veio gritar aquilo que estava escrito no papel para toda a fila começamos a achar que talvez fosse verdade. Não fomos todos, não fosse o diabo tecê-las. Alguns de nós foram num instante ao bar saber se era verdade, viram que sim e chamaram os outros. E foi assim que só com apenas uma cerveja (intragável por sinal) me vi com apenas 20 pessoas à minha frente para entrar. Chegam as 18h00 e com ele primeiro grande momento do dia. À entrada, o porteiro diz que será autorizado todo o material de fotografia, vídeo e som que não seja amador. Até nisto o Dave é grande. A escolha do lugar não foi difícil. Bem ao meio, com apenas 3 ou 4 pessoas à frente. Restava esperar e ver quem eram aqueles tais de Subculture que eram anunciados juntamente com Dave Matthews. Às 18h30, as luzes apagam-se. Vai começar o espectáculo. As pulsações sobem. Naquela altura, não sabíamos se os Subculture iam fazer a primeira parte ou se iam tocar com o próprio Dave Matthews. Se o coração disparou, depressa se acalmou. Quem entra na sala é um jovem, sozinho com apenas uma guitarra. Sentado num banco toca durante 45 minutos músicas calmas, de embalar, com boa sonoridade e voz mas tudo muito igual. Simpático, brinca com o público e despede-se rigorosamente às 19h10. Estava feito. Agora a sala seria só para o Dave. Olho à volta. Aquilo não era muito diferente de uma discoteca apinhada. Imaginem num espaço com dois andares em que o segundo é uma varanda. Por baixo da varanda são os bares. No espaço não coberto pela varanda é a pista de dança (naquele caso a plateia). Está cheia como um ovo. À frente estava o palco. O calor também aperta mas isso já não interessa para nada. A impaciência cresce de forma exponencial à medida que os segundos passam. Olho o relógio, são 19:28. Tinham-nos dito que o concerto estava terminado no máximo às 22h00. Não tinham sequer passado 2 minutos quando a música que estava a dar (Jack Johnson) se cala. As luzes voltam a baixar e a festa toma conta do recinto. Dave entra sorridente. Sozinho mas seguro. Ocupa todo o palco. De calças de ganga e camisa azul, apenas com a sua guitarra prepara-se para os seus primeiros acordes. Bartender abre as hostes. O público mostra-se em sintonia com o músico e cantam a letra toda sem uma única falha. Seguem-se Grey Street, So Much to Say, Where are You Going e Smooth Rider. O concerto começa bem. Dave faz questão de mostrar que está bem disposto. Ri-se, conta histórias, faz palhaçadas no palco. O concerto continua. É tempo agora de visitar com mais pormenor o seu álbum a solo. Stay or Leave e Save Me saem seguidas e juntamente com Old Dirt Hill preparam o verdadeiro primeiro grande momento da noite. Dancing Nancies surge com todo o publico a cantar bem alto. Nesta altura as músicas de DM e de DMB alternam-se. É tempo de Some Devil (vê-lo numa guitarra eléctrica, para mim, é estranho). Everyday, Gravedigger, Crush e Lie in Our Graves e So Damn Lucky fecham a primeira parte. Uma primeira parte que deixa Dave Matthews encharcado em suor e o público em êxtase. Até podia ficar por ali que já tinha sido excelente. Mas o público queria mais. E o Dave também.
De regresso, já com uma t-shirt, continua bem disposto e com vontade de conversar. Pede ao público silêncio e que o ajude naquela música dedicada à irmã. É a hora de Sister. A tão aclamada versão de All Along The Watchtower tem tanto de fantástica como de tenebrosa. Dave Matthews despede-se do público, promete regressar brevemente com “the rest of the guys”, acena, sorri e finalmente vira costas e sai do palco. Algures pelo meio, um cachecol de Portugal voa para o palco. Ele olha para ele não percebe o que é e ignora-o. Já temos uma missão para quando ele vier cá. O cachecol passa pelas mãos de um técnico de som que o coloca dobrado em cima de um banco junto ao chá que ele está a beber. A sensação de que o concerto poderia ter chegado ao fim invade-nos. Mas logo se percebeu que não seria assim. O público continua a exigir mais. Com toda a sua força bate com os pés no chão. O delírio acontece quando Dave regressa ao palco. Para o fim estavam reservadas mais duas potentes. Too Much surge mais calma que o normal, mas bem suportada pelo público. Depois… bem depois era o esperado. O que não evita que o púbico quase entre em histeria. Todos juntos cantamos palavra a palavra a letra de Crash Into Me. Do primeiro ao último acorde. No fim, com a sensação de missão cumprida, público e artista despedem-se com gritos, acenos, apertos de mão, juras de amor e muitas palmas. Depois… bem… depois foi digerir o pós concerto da maneira possível ao som de Radiohead que passava nas colunas do recinto. À saída, tempo para a típica compra de t-shirts e para as últimas fotos. Do concerto, fantástico a todos os títulos fica apenas uma crítica. Em alguns momentos de algumas músicas sentiu-se a falta, pelo menos, de mais uma guitarra. Ah grande Tim… onde andavas tu?
O dia seguinte, passado em Londres algures entre as margens do Rio Tamisa e o Hyde Park o grupo tenta digerir o dia anterior como pode. As músicas passam na cabeça de todos e não raras vezes nos encontramos os quatro a cantar em voz alta a mesma música.
São mais ou menos 9h40 quando o avião da Ryanair toca o chão do Aeroporto de Francisco Sá Carneiro. O Porto recebe-nos quente e com um céu azul. A cinzenta Inglaterra ficava para trás e com ela um fim-de-semana que agora, à distância de alguns dias, parece simplesmente perfeito demais para ter acontecido. Foi um sonho. Mas um sonho que ainda não acabou. Está apenas interrompido. Resta saber até quando…
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